segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

2ºParte do desfecho da resenha da obra deAdolphe Bossert-"INTRODUÇÃO Á SHOPENHAUER"- editora Contraponto,Rio de Janeiro.

" Do mesmo modo que a inteligência recebe os dados da sensibilidade e com ele forma juízos, a razão retoma os juízos formados pela inteligência para agrupá-los, religá-los, reduzí-los a um sistema. Assim como a sensibilidade tem suas formas e a inteligência tem suas categorias, a razão tem suas ideias diretoras, segundo as quais ela constrói  as ciências. 
São as ideias de Alma, Universo e Deus, sobre as quais se fundamentam Psicologia, Cosmologia, e Teologia Racionais; ideias independentes de qualquer experiência e, por conseguinte, vazias de todo conteúdo real". Schopenhauer não tem dificuldade para mostrar que, dessas três ideias que Kant coloca em pé de igualdade e que apresenta como igualmente incondicionada, ao menos duas-O Universo e a Alma- são condicionadas pela terceira, que é Deus; que as ideias de Kant, puros conceitos racionais, não tem relação alguma com as de Platão, que são, pelo contrário, a soma de toda a realidade; que existe alguma contradição em admitir que algumas ideias se impõem á razão, embora a razão seja impotente para demonstrá-las para si mesma e para representá-la como existentes; enfim , que a " dialética transcendental" não passa de uma excrescência inutil do sistema Kantiano.
" Kant mantém as ideias da razão porque se propõe a dar-lhes depois uma existência real, na" Crítica Da Razão Prática", livro no qual mostra que a lei moral, sendo absoluta, supõe um legislador também absoluto, e que a liberdade, consequência da obrigação moral, supõe á responsabilidade, a remuneração final, a imortalidade da alma.
Assim, o sistema de Kant, em muitos pontos, é um compromisso e mesmo um conflito entre a sagacidade de seu espírito crítico e as necessidades de sua alma religiosa. (trechos retirados da página 143);

" Schopenhauer tem uma maneira de filosofar diferente da de Kant: percebe-se isso pelas inconsequências que lhe censura. ele tem um traço em comum com Kant: o amor pela verdade. Até sua mãe, mais propensa  a ver seus defeitos que suas qualidades, reconhecia nele o raro mérito de ser sempre franco consigo mesmo e com os outros. Mas, na obra de Shopenhauer, a verdade tem modos altivos; ela comanda e se impõe; não admite hesitação alguma, qualquer demora; revolta-se contra as resistências. A filosofia de Schopenhauer brota de uma fonte única, a teoria da vontade, se cristaliza em seu primeiro jorro. Aquilo que ela é de, início, continuará a ser, e torna-se forçoso que o mundo a receba tal como ela é: esta é a íntima convicção e a inquebrantável esperança de seu autor.Kant tinha algumas tradições de família e vínculos nacionais; ele pertencia a um Estado, a uma igreja, sabia que era membro de uma sociedade e fazia questão de não romper seus laços com ela.
Schopenhauer desde cedo, viu-se separado dos seus e jamais teve pátria; " envergonha-se de ser alemão"." Seus pensamentos é o de um estranho neste mundo; indiferente ao que nos toca mais de perto, sem piedade pelas nossas fraquezas e sem respeito pelas nossas ilusões, ele segue em frente, sem outra preocupação além de por na pista do verdadeiro e de surpreendê-lo em seu refúgio mais profundo. (pg 144);
" Para Shoepenhauer, como para  Kant, a faculdade de conhecer é, sucessivamente, sensibilidade, inteligência e razão. ele só difere de Kant, pelo papel mais modesto que atribui á razão. Shopenhauer não admite as Ideias transcendentais de Kant, as ideias de Alma, Universo e Deus sobre as quais ele fundamenta a Psicologia, a Cosmologia e a Teologia Racionais, simples entidades lógicas ás quais a própria razão não pode emprestar qualquer conteúdo real, e que recebem sua certeza apenas da consciência moral. Algumas ideias desprovidas de toda realidade objetiva não podem fornecer, segundo Shopenhauer, apoio sólido para as ciências, só entravam suas descobertas". Pg 147;
" Toda instituição é intelectual. Sem  a inteligência, não haveria intuição alguma, nenhuma percepção de objetos. Para que exista intuição, ou seja, para que tomemos conhecimento de um objeto, é necessário, em primeiro lugar, que nossa inteligência relacione cada impressão que nosso corpo recebe a uma causa que ela transporte, essa causa para um ligar do espaço de onde parte o efeito experimentado, e que, assim, ela reconheça a causa como efetua, como real, como uma representação do  mesmo   tipo que nosso príoprio corpo." (pg 148);
" O mundo  é minha representação: eis aí uma  verdade que se aplica á todo ser vivo e cognoscente. Só o homem, no entanto, é capaz de transportar essa verdade para o domínio da consciência abstrata e reflexiva; e, no dia em que o faz, o espírito filosófico nele nasceu". (pg 148);
" [....] Nenhuma verdade é mais segura, mais independente de qualquer outra, nenhuma tem menos necessidade de prova do que esta: tudo aquilo que se oferece ao nosso conhecimento, ou seja, o mundo interno, nada mais é que o objeto em relação ao sujeito, percepção em relação a alguma coisa que percebe, em resumo, representação"(pg 149);
" Descartes, acrescenta Shopenhauer, pressentiu essa verdade quando disse; "penso, logo, existo"; e quando estabeleceu , assim, que o ponto de partida de toda filosofia é um ato da inteligência, isto é, um fato interno".(pg 149);
" A idealidade do tempo, descoberta por Kant, já está contida na lei da inércia, que pertence á mecânica. Porque, no fundo, essa lei estabelece que o tempo não pode produzir por si só nenhum efeito físico, e que, por conseguinte, por si só e em si mesmo, ele nada modifica nem no repouso nem no movimentode um corpo. Por conseguinte, o tempo não tem qualquer realidade física, só tem uma existência ideal, transcendental, isto é, retira sua existência não das coisas, mas do sujeito cognoscente."(PG 150);
" Pelo contrário, o tempo passa sobre as coisas sem imprimir nelas a menor marca".(pg 150);
" O tempo não é um simples movimento ou uma trasformação qualquer dos corpos. Pelo contrário, todo movimento, toda transformação, só ocorre nele, é condicionada por ele. O relógio adianta ou atrasa, mas não o tempo. Pelo contrário, a marcha normal e uniforme , acordo com a qual são determinados o avanço ou o retardo é precisamente aquilo que se chama de curso do tempo. O relógio mede o tempo, ele não o produz.Mesmo que todos os relógios parassem, mesmo que o sol ficasse imóvel, mesmo que todo movimento, toda transformação, cessasse, o tempo não suspenderia por um instante sua marcha"(pg 151; 152;)
" No entanto, não podemos nos equivocar quanto ao verdadeiro pensamento de Shopenhauer. Ele não nega a realidade do mundo exterior, e nisso se separa de forma decisiva do idealismo absoluto. "(pg 155);
 " O espaço e o tempo, as condições primeiras de todo conhecimento, não passam de quadros vazios: é a causalidade que os preenche; ela é o laço entre o espaço e o tempo. O espaço sozinho é a extensão fixa e imóvel; o tempo sozinho é o fluxo incessante e inapreensível. O tempo e o espaço reunidos são a duração, a substância que permanece quando a forma e a qualidade se modificam". (pg 157);
" O espaço, o tempo e a causalidade: estas são, portanto, as três formas de nossa intuição. São como moldes que apresentamos ao mundo exterior e nos quais o configuramos segundo nossa conveniência. Esses são os instrumentos de nossa representação. Porém, a cada classe de representações corresponde uma manifestação específica de nossa faculdade de conhecer. O tempo e o espaço têm como correlato, em nosso espírito, a sensibilidade, denominação não totalmente exata, diz Schopenhauer- porque" sensiblidade" já supõe " matéria"-, mas que é preciso conservar, com lembrança" daquele que, aqui, abriu o caminho". O correlato da causalidade ou da matéria, o que vem a dar no mesmo, é a inteligência".(pg 158);
A ciência abstrata, a ciência dos livros, torna o homem inapropriado á vida. Ler é pensar com a cabeça do outro; ora, com esse exercício, termina-se por perder o uso de sua própria cabeça. Schoepnhauer compraz-se em pintar a miséria intelectual do sábio que só é sábio pela ciência alheia. e, no capítulo mencionado, ele se encontra sem querer Com Montaigne. " Na verdade", diz Montaigne, falando dos sapientes," na maioria das vezes, eles parecem desprovidos até do senso comum. Porque o camponês e o sapaterio, vós os vedes seguir simples e ingenuamente seu caminho, falando daquilo que sabem quanto aos sábios, por quererem se elevar e se defrontar com esse saber que voga na superfície de  seu cérebro, vão se embaralhando e enrredando sem cessar. Escapam deles belas palavras, mas que outro as acomode! Eles sabem a teoria de todas as coisas: buscai quem a ponha em prática"(.PG 167); 
" Por fim, a inteligência está muito desigualmente partilhada entre os homens. A natureza, na repartição de seus dons, é ainda mais aristocrática que a sociedade. Os espíritos malfeitos são a regra, os espíritos elevados são raros, e o gênio é um monstro. essa desigualdade abre entre os homens um abismo que só " a bondade do coração" é capaz de transpor. A bondade é o princípio unificador da sociedade, o verdadeiro laço entre alguns seres cuja inteligência os separaria para sempre. Esse laço ainda é muitas vezes partido. Um espírito superior conversando com um espírito medíocre é como um cavaleiro montado num corcel afoito tendo de acompanhar um pedestre, ele apeará por alguns instantes, para andar ao lado de seu companheiro; porém, a impaciência de sua montaria logo o forçará a se pôr de novo á sela e deixar ali o viajante menos equipado.(pg 170);
" Schopenhauer acaba de mostrar que, depois de Kant, nossa inteligência nos faz conhecer apenas fenômenos, ou seja, aparências, e que ela nada nos ensina sobre a realidade das coisas. E como essas aparências, essas imagens que nos nossos sentidos nos apresentam, essas representações que formamos dos objetos, estão em nosso espírito, e apenas nele, somos nós mesmos- de alguma forma- que nos vemos no mundo exterior; nós nos desdobramos em uma miragem. Uma ilusão permanente nos rodeia e envolve, forma uma barreira entre nós e as coisas, nos impede de sair de nós mesmos.Existiria um meio de dissipar essa ilusão? (pg 173);
"Mas o que é a vontade segundo Schopenhauer? Será simplesmente, de acordo, com o sentido comum da palavra, a atividade consciente de um ser inteligente? Não.Ele a chama, além do mais, de querer viver, a tendência á vida inerente a qualquer criatura; e essa denominação corresponde melhor á sua ideia. Schopenhauer abarca- para não dizer unifica- no mesmo ponto de vista todas as manifestações vitais da múltipla natureza. O papel da filosofia não seria mostrar a unidade na diversidade? Eis como ele raciocina.(pg 175);
" Meu corpo, como simples representação, é um objeto em tudo semelhante aos outros objetos que preenchem o espaço.
Ora, eu constatei que meu corpo também  pode ser conhecido de outra maneira, absolutamente diferente  da intuição,  que eu designo pela palavra vontade. Será que eu não estaria autorizado a pensar que  os outros corpos, que ainda são conhecidos por mim apenas como representação, são também, de outro ponto de vista, fenômenos de vontade?
(pg 175);
" Não é somente o ceticismo, é sobretudo, o materialismo que Schopenhauer pretende combater. Para o materialismo, a vontade, ou seja, a atividade consciente e refletida, não passa de um modo particular da força que rege o mundo físico.Porém, embora se possam calcular os efeitos de uma força, não se pode dizer aquilo que ela é em si mesma, não é possível penetrar a sua essência. Colocar a vontade sob o conceito geral de força é, portanto, definir uma incógnita por meio de outra incógnita. Além do mais, a força está intimamente ligada ao mundo fenomênico e não nos permitirá jamais ultrapassá-lo. Pelo contrário, " reduzir o conceito de força ao de vontade é reduzir uma coisa desconhecida a algo infinitamente mais conhecido( o que estou dizendo?!), á única coisa que conhecemos imediata e absolutamente. È ampliar sobremaneira o nosso conhecimento". Schopenhauer inverte, portanto, a ordem dos termos. A vontade torna-se o gênero,  e a força, a espécie. " (Pg176).
" Shopenhauer acusa muitas vezes os filósofos de terem desviado a palavra Ideia de seu sentido primitivo; não vê que ele próprio, aqui, não é totalmente fiel ao pensamento de Platão. (pg 181);" seria bem possível, olhando de perto, achar uma contradição na relação que Schopenhauer estabelece entre as nossas faculdades. Para ele, a inteligência é uma função do cérebro; ele chega a empregar muitas vezes um termo em lugar do outro. Ora , o cérebro é uma parte do corpo, ele próprio um produto da vontade. Como a inteligência viria, logo depois, esclarecer a vontade, sua mãe? è preciso lembrar aqui, como em diversos outros pontos, as palavras de Schopenhauer: " Não existe nada mais fácil e também nada mais inútil do que refutar um filósofo". (pg 185);
" Se percorremos de alto a baixo a escala hierárquica dos animais, descobrimos que, nela a inteligência se torna cada vez mais fraca, mas não observamos de maneira alguma uma correspondente degradação da vontade. O menor inseto quer aquilo que quer de modo tão resoluto e perfeito quanto o homem; só existe diferença naquilo que ele quer, e isso depende da inteligência . A vontade é simples em si mesma; sua função é unicamente querer ou não querer; e, em virtude de sua simplicidade, ela não comporta graus; è sempre igual a si mesma."Ela só apresenta gruas em sua maneira de ser afetada, que vai da inclinação mais fraca até a paixão; e em sua facilidade de ser afetada, que vai de temperamento fleumático até o colérico. A inteligência, ao contrário, não tem graus somente em sua maneira de ser afetada, do torpor á fantasia ou ao entusiasmo; ela os tem em sua própria essência, em sua maior ou menor perfeição, desde o animal situado no ponto mais baixo da escala- dotado apenas de uma percepção confusa- até o homem, e, na espécie humana, desde o imbecil até o homem de gênio."(pg 186);
" A inteligência, mesmo em sua perfeição,se fatiga após um longo esforço. O cérebro, como todas a outras partes do corpo, tem necessidade de repouso. A vontade, ao contrário, é infatigável. ela mostra, desde o berço do homem, que é o elemento primitivo de seu ser.Uma criança de colo, que tem somente um clarão de inteligência, atesta pelo choro a necessidade de querer que é superabundante nela; ela quer com energia, antes mesmo de saber o que quer. Ao contrário, a inteligência se desenvolve aos poucos,paralelamente á evolução do cérebro e ao grau de maturidade de todo o organismo. " (pg 186);
" A inteligência e a vontade são, portanto, no fundo, independentes uma da outra. Mas é nesta última, ou seja, nas inclinações, nos hábitos, no caráter, em tudo aquilo que constitui a vida moral, que residem a essência do homem e seu verdadeiro valor. Não seria possível censurar ninguém por carecer de espírito; desculpa-se mesmo, de bom grado, um imbecil dizendo " Que ele não pode mais que isso", no entanto, ninguém pensa em invocar a mesma desculpa para um malfeitor. A opnião é guiada por um instinto muito seguro na maneira como ela determina as responsabilidades."(pg 191);
" A inteligência, a beleza e o gênio nos valem a admiração dos homens: a bondade atrai sua simpatia: e,  se nos interrogarmos com sinceridade, descobriremos que é pelo grau de nossa bondade que medimos involuntariamente a estima que temos por nós mesmos." È por isso que lançamos um olhar indiferente e mesmo complacente sobre as tolices e as loucuras da nossa juventude, ao passo que as falhas de caráter das quais nos tenham acusado, as más ações que tenhamos cometido, erguem-se ainda diante de nós como um remorso na extrema velhice". (pg 192);
" A filosofia de Shopenahuer tem dois antecedentes: o racionalismo de Kant e o idealismo de Platão. Sua teoria do conhecimento deriva de Kant, seu quadro das artes se inspira em Platão. As ideias de Platão são a expressão mais poética, mais sedutora jamais conferida ao idealismo. As ideias, as únicas realidades, das quais os pretensos objetos reais não passam de cópias imperfeitas, tornam-se, na obra de Shopenhauer, os modelos das espécies, manifestações imediatas a vontade e elevadas, como ela, acima das condições de tempo e espaço. As ideias são sempre, não vêm a ser jamais, ao passo que os indivíduos que as representam diante dos nossos olhos vêm a ser, isto é, nascem e desaparecem ." Pg 195);
" A contemplação pura e desinteressada e a união íntima com a natureza, consequência dela, são a primeira condição da arte e o resumo de todas as suas regras. A arte tem origem no conhecimento das ideias, sua finalidade é a transmissão desse conhecimento. Seu objeto se distingue essencialmente de todas as espécies de ciências. As ciências naturais e as ciências históricas assentam-se no princípio da causalidade. As ciências matemáticas estudam o tempo e o espaço. Ambas têm como objeto o fenômeno, ou seja, o mundo que se modifica. A arte é a representação do mundo naquilo que ele tem de permanente." (pg 199);
" O caráter é a beleza do indivíduo, do mesmo modo que a beleza é caráter da espécie.". (pg 208);
" O sentido nominal concerne á história ou, se preferirem, á literatura; só o sentido real pertenceá arte e interessa ao conhecedor: " Uma nação da mais alta importância histórica pode ser a mais banal deste mundo do ponto de vista de seu sentido interior; e, inversamente, uma cena da vida cotidiana pode ter um sentido interior muito profundo quando desvela o âmago oculto do ser humano, quando faz saltar aos olhos a atividade humana, o querer humano. Por outro lado, duas ações exteriormente muito diferentes podem ter o mesmo sentido interior.Desse ponto de vista, pouco importa senão ministros decidindo a sorte das nações sobre uma carta geográfica ou algumas pessoas sentadas á mesa de uma taberna discutindo enquanto jogam cartas ou dados."(pg 209).


(FIM)


domingo, 16 de dezembro de 2012

Desfecho da resenha de Adolphe Bossert-" Introdução á Schopenhauer"EDitora Contraponto.

" A cor, a manifestação mais expressiva da vida na natureza, a cor que anima o olho do homem, que se irradia na superfície das plantas e dos minerais, que se manifesta de mil maneiras nos espaços do céu, é um dos fenômenos que mais atraíram a atenção dos pensadores e dos poetas. Eles queriam conhecer sua natureza própria, sua relação com a luz, seu modo de transmissão até o olho. Porém, por todo o período em que a ciência se confundiu com a filosofia, a observação científica ou  pseudociêntifica praticamente  não foi além de recolher e comparar as impressões que o homem recebia  de maneira direta da natureza; e essas impressões dependiam necessariamente do caráter do observador, da mesma forma que as conclusões que ele tirava delas se atinham ao conjunto de seu sistema".(página 83);
" Assim, nas ciências físicas, e em particular na teoria das cores, desde Aristóteles até o fim da Idade Média, o progresso era quase imperceptível.  Aristóteles , que viu na natureza tudo aquilo que um homem pode ver apenas com o auxílio dos sentidos, parece ter pressentido algumas descobertas que só se tornaram possíveis com os métodos de experimentação da ciência moderna".(pg 83);
" Porém, se tiramos a cor, tiramos, no mesmo lance, toda a visão das coisas,porque toda coisa visível só é vista por meio da superfície colorida" [...]
" Tudo aquilo que é vísivel no mundo só o é por causa de uma luz sombreada ou de uma sombra iluminada". (pg 84);
" A luz não é una, é múltipla, e se compõe de raios refratados de diversas formas e que, segundo o grau de refração , constituem a gama das cores. " (pg 86);
" A cor nada mais é que uma variação da luz, e aquilo que chamamos de luz é apenas a sensação luminosa que projetamos, por assim dizer, para fora de nós, e á qual atribuímos existência real". (pg 86);
"Assim, a cor é sucessivamente a luz obscurecida a sombra iluminada. " (pg 91);
" [...]A filosofia jamais teve relações com os compostos.Seu objetivo é a noção, a unidade na diferença. [....] A luz está fora da esfera das determinações físicas. O claro fixado sobre um corpo é o branco, que ainda não é uma cor. O escuro, materializado e especificado, é o negro. Entre os dois extremos se situa a cor. Ela é apenas a ligação entre a luz e a escuridão, e somente essa ligação específica produz a cor. " (pg 93);
" Assim, é a noção, uma entidade  abstrata, que determina a solução de um problema científico. Não seria preciso que a natureza entrasse nos compartimentos que o filósofo lhe apresenta? Aliás, Luz, escuridão e cor são afirmação, negação e conciliação, tese, antítese e síntese, ou seja, uma dessas trilogias sobre as quais Hegel edifica seu sistema e que se sustentam umas das outras como os arcos superpostos de uma fachada gótica".(pg 93);
" Sem querer ofender Schopenhauer, é possível ter o espírito de honestidade em si e estou enganado quanto á natureza das cores, sobretudo quando ela só foi experimentada pela metade. Ele mesmo é uma prova disso, além de Goethe.". (pg 94);
" Schopenhauer dizia, como Rousseau, que seus melhores pensamentos lhe vinham caminhando. ele estava sempre munido de uma caderneta, na qual anotava suas observações á medida que a ocasião favorável as fizesse surgir.
Em cada artista, em qualquer gênero, tem  um procedimento, um só, que lhe é inato, por meio do qual ele se apodera da natureza; que o dele era apreender a concepção primária ainda bem quente, por assim   dizer, e inundá-la logo com um jato de fria reflexão para cristalizá-la e conservá-la. Inimigo do vago, fixava em poucas palavras precisas todo pensamento que lhe ocorria, deixando para desenvolvê-lo em página, e sem seguir uma ordem , os dois volumes manuscritos in-quarto hoje conservados na Biblioteca Real de Berlim, que contêm a substância de sua grande obra, o mundo como vontade e como representação". (pg 104): " Schopenhauer tinha travado relações com os artistas alemães em Roma; mas achou-se desde o início em completa oposição de ideias com eles. Seguia o gosto clássico em literatura e, em matéria  de arte, era pagão, á maneira de Goethe. No círculo que frequentava, todos  se declaravam românticos e patriotas, duas palavras que, no fundo, designavam a mesma coisa. A pa´tria que se invocava não era mais a estrangeira. A Santa Aliança fizera prevalecer outro ideal, e a literatura e as artes haviam seguido a evolução da política". (pg 113);
" A pátria que se sonhava em meados de 1820, era a velha pátria germânica da Idade Média, o santo Império Romano, com um imperador eleito, consagrado pelo papa, cercado por seus príncipes e dignitários laicos e eclesiásticos.(pg 113);" os artistas alemães que iam a Roma não se incluíam mais, como no século XVIII, na  escola da Antiguidade. Eles copiavam doutamente as inexperiências dos pintores que o espírito do Renascimento ainda não tocara, aqueles que foram chamados de primitivos- embora eles próprios tivessem diante de si outros primitivos, cujos procedimentos aperfeiçoavam lentamente. " (pg 113);
" Schopenhauer não era homem de contornar qualquer obstáculo que encontrasse em seu caminho . Também não estava disposto a abandonar a menor parcela daquilo que chamava de seu direito". (pg 115);
" A perturbação momentânea  que avassalou as finanças de Schopenhauer foi uma das causas que o levaram a buscar apoio e recursos no ensino universitário." (pg 119);
" Schopenhauer não era homem de contornar qualquer obstáculo que encontrasse em seu caminho. Também não estava disposto a abandonar a menor parcela daquilo que chamava de seu direito". (pg 115);
"Sabemos também que o derradeiro esforço da dialética de Hegel era encontrar a fórmula filosófica do estado prussiano, ao passo  que Schopenhauer, proibindo-se qualquer alusão á política do dia, pretendia ensinar apenas para a " Humanidade de todos os tempos e de todos os países". Hegel dizia que a lei do desenvolvimento histórico era a propagação da liberdade no mundo, mas tinha o cuidado de acrescentar que o Estado, sendo uma forma da Ideia absoluta, devia ter sua representação material, una e intangível, na pessoa do soberano. Ele considerava a filosofia superior á religião, mas afirmava também que o fundador do Cristianismo era mais alta personificação de Deus na terra. Essas contradições entre o espírito do sistema e as aplicações que o mestre fazia dele só o vieram á luz mais tarde, e tornaram-se então a causa principal da dissolução da escola."( pg 120);
" Mas, naquele momento, Hegel tinha o apoio dos políticos e dos teólogos, e seu ensinamento difundido por seus discípulos, tinha a força de uma instituição de Estado". (pg 122);
Schopenhauer observa que seu próprio humor se suaviza no contato com a leveza italiana.ele se torna mais indulgente com as opniões dos outros;busca as distrações mundanas, das quais outrora fugira, -" Rio de mim mesmo quando passeio com um dominicano claro pelos jardins Boboli, e quando me surprendo a reclamar com ele da decadência dos conventos; ou quando, no salão brilhantemente iluminado de uma villa, faço a corte a uma inglesa".E, em carta posterior; " Eu estava sociável como não era há muito tempo; frequentava até a alta sociedade. Com isso, minha experiência e meu conhecimento dos homens foram ampliados, eesse tempo não foi de maneira alguma perdido pra mim. ver e conhecer é tão útil quanto ler e aprender. tive todo o tempo livre para estudar as obras de arte reunidas em Florença, e o povo italiano forneceu amplo material para minhas observações."(pg 124);
" Em maio de 1825, Schopenhauer foi bruscamente arrancado de seus estudos por um ridículo processo, que se arrastou havia quase quatro anos  exigia sua presença em Berlim. Tratava-se de um fato que datava de sua precedente estada naquela cidade, e que remontava ao mês de agosto de 1821. Uma costureira pouco discreta, que ocupava um quarto na mesma casa que ele, um dia se instalara diante da sua porta para controlar as visitas que o filósofo recebia.Ele  intimou-a a se retirar e, diante da recusa, empurrou-a com violência no corredor para onde dava o apartamento. A mulher alegou ter sido agredida por ele  e arrastada pelo chão. deu queixa, o que de início só teve como resultado condená-la a pagar as custas do processo. Ela apelou.";(pg. 126);
Schopenhauer traçou, em 1826, o primeiro esboço  de um de seus melhores escritos, os Aforismos sobre a sabedoria. 
No ano seguinte, escreveu " Física astronômica", mais tarde capítulo de A vontade na natureza. Um artigo publicado em 1829 na Foreign review de Londres sugeriu-lhe o projeto de traduzir para o inglês as obras de Kant. Ninguém era mais qualificado que ele para tal empreitada, e não havia nenhuma fatuidade de sua parte  ao escrever" Que talvez não se encontrasse, no espaço de um século, outra cabeça onde estivessem reunidos tanto Kantismo e tanto inglês quanto na minha". dois editores aos quais ele se dirigiu sucessivamente recuaram diante dos custos. Já sabendo inglês, francês, e italiano. ele tinha começado, em 1825 a estudar espanhol, traduziu o oráculo manual, do moralista Baltasar Gracian. Porém, mais uma vez, faltou-lhe a intermediação necessária como público- o editor- e a tradução só foi publicada depois de sua morte. ".(pg 128); 
" Foi um erro de Schopenhauer acreditar, ou, antes, persuadir-se de que Fichte, Schelling, e Hegel  tinham sido falsos  intérpretes da doutrina de Kant: um terrível erro voluntário, porque Shopenhauer jamais se dera ao trabalho de refutar com seriedade seus três predecessores. ele se contentava em chamá-los de " os três grandes sofistas". Quanto a Hegel, em particular, desvencilhava-se dele com pouco esforço, declarando-o ilegível- o que era verdade, em certo sentido, e podia servir de justificativa para um simples leitor, mas não para um adversário. Se tivesse desejado olhar mais de perto, teria se convencido de que o idealismo de Fichte, Schelling e Hegel, não nenos que sua própria teoria do conhecimento, tinha raízes no criticismo de Kant."(pg 133);
" O ponto capital da filosofia de Kant é o caráter relativo e condicional do saber humano. Nosso conhecimento se compões de nossos juízos, e estes se fundamentam em nossas percepções. Ora, aquilo que  percebemos não são as próprias coisas, mas a imagem  das coisas que nossos sentidos nos transmitem. Em outras palavras, nosso saberé feito de aparências. Vemos tudo sob as condições do tempo e do espaço. que são como as formas de nossa sensibilidade. Um ser que vivesse fora do  tempo e do espaço não perceberia nada do que percebemos. Pele mesma razão, tudo que está fora do tempo e do espaço- o eterno , o infinito, o absoluto- nos escapa, e todas as ideias que formamos sbre isso só podem ser quiméricas; é o " fruto proibido" do qual é preciso se abster. A filosofia desceu, como nos tempos de Socrates, do céu á terra. A metafísica não é mais uma construção ambiciosa, como a pretensão de abarcar a universalidade das coisas e explicar o mistério da criação. Ela se transforma " na ciência dos limites da razão Humana".
" A faculdade de conhecer  se manifesta, segundo Kant, sob três formas sucessivas; em primeiro lugar, ela é sensibilidade ou faculdade de perceber; em seguida, inteligência ou faculdade de julgar; por fim, razão ou faculdade de coordenar os juízos e reduzí-los a um sistema. A sensibilidade, como primeira ma nifestação da faculdade de conhecer, não é puramente passiva; perceber já é agir.A matéria que osa seus órgãos lhe fornewcem, a sensibilidade apresenta seus moldes, que são as noções de tempo e espaço. ela configura e trasforma tudo que recebe, elapõe em tudo sua marca, sua assinatura, substitui o mundo real por um mundo de fenômenos que lhe pertence, que é obra sua , e que ela transmite a inteligência e a razão.
Nesse sentido, Kant pôde dizer que a razão humana cria o Universo. ele pretendia falar somente do universo sensível, do conjunto dos fenômenos que, para nós,  substitui a universalidade das coisas. Seus sucessores tiveram apenas que apagar a distinção entre o mundo real e o mundo fenomênico para entrar no idealismo absoluto. ( trechos retirados da página 134);
 o eu humano torna-se sujeito absoluto; ele contém virtualmente todo conhecimento e toda realidade. ele é a essência inteligível do mundo fenomênico.Os objetos sensíveis nãopassam de um limite que ele encontra fora de si,ou, antes, que opõe a si mesmo, mas que ele força incessantemente a recuar diante de si,á medida que sua infinita vritualidade se manifesta e se realiza nesse mundo. A baliza do desenvolvimento filosófico seria a absorção completa da natureza pela humanidade, ou, para falar a linguagem de Fichte, a identidade entre o eu e o não-eu; ou ainda, como dirá hegel, a realização da Ideia absoluta no espírito humano, o nascimento de deus no homem. (pg 135);
" Para Schopenhauer, todo o desenvolvimento filosófico ao qual se vinculam os nomes de Fichte, Schelling e Hegel não passa de uma excrescência parasitária do Kantismo. Ele não esgota as invectivas contra "os três sofistas". Deseja reconhecer "algum talento" em Schelling. mas Fichte não passa " da caricatura de Kant", o espelho amplificador de seus defeitos". 
" Quanto a Hegel, esse "Calibã" da filosofia", quem poderia dizer o número de cérebros que que ele transtornou? O strês representam " a descendência bastarda" de Kant, de quem ele é o herdeiro  legítimo: esse é o espírito habitual dos prefácios e das digressões de Schopenhauer". (pg 136);
" Para Schopenhauer, Kant é o verdadeiro iniciador dos estudos filosóficos. O efeito que a leitura de seus escritos produz sobre um espírito bem constituído pode ser comparado- diz ele- ao que a operação da catarata produz sobre um cego. Com Kant começa uma nova maneira de filosofar. " (pg 137). D o mesmo modo que a inteligência recebe os dados da sensibilidade e com ele frma juízos, a razão retoma os juízos formados pela inteligência para agrupá-los, religá-los, reduzi-los aum sistema." (pg 143); Assim como a sensibilidade tem suas formas e inteligência tem suas categorias, a razão tem suas ideias diretoras, segundo as quais ela constrói as ciências. São as idéias da alma, universo e Deus, sobre as quais se fundamentam psicologia, cosmologia e teologia racionais; ideias independentes de qualquer experiência,e por conseguinte, vazias de todo conteúdo real." (pg 143);


sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Finalização da resenha de Adolphe Bossert-" Introdução a Schopenhauer-Ed Contraponto

" Assim,  o homem de gênio, em geral  propenso á melancolia, mostra vez por outra essa serenidade particular que só a ele é possível , que paira sobre sua fronte,  como um raio de luz, e que se deve ao fato de que o seu espírito sabe se identificar completamente com o mundo exterior"(pg 38);
" Um homem que encurva  as costas  sobre a mesa ou escrivaninha parece um sapateiro remendão disfarçado"(pg.39);" Seu pai morreu em 20 de Abril. Não se sabe se caiu ou se jogou de um celeiro no canal que passava atrás da casa. As circunstâncias da morte jamais foram esclarecidas.
" Schopenhauer assegura - e podemos acreditar em sua palavra- que jamais houve no mundo um empregado de comércio pior que ele. Qualquer pretexto era bom para se furtar a um  trabalho que o repugnava. A única coisa que o interessava nos últimos meses do inverno de 1805 eram as conferências que o dr. Gall foi fazer em Hamburgo, sobre frenologia."(pg 41);
* Franz Gall ( 1758-1828), médico alemão que criou a frenologia, pseudociência que estuda o caráter e as faculdades intelectuais do indivíduo pelo formato do crânio."
" Seu pai morreu em 20 de Abril. Não se sabe se caiu ou se jogou de um celeiro no canal que passava atrás da casa. As circunstâncias da morte jamis foram esclarecidas" (pg 41);
" O certo é que havia algum tempo se observava em Heinrich Schopenhauer uma singular fraqueza de memória; ele não reconhecia mais  os amigos,falava com eles como se fossem estranhos" (pg 42);
" Na maioria das vezes, os loucos não se enganam no conhecimento daquilo que está imediatamente presente; suas divagações se relacionam sempre á coisas ausentes ou passadas, e, indiretamente, á ligação dessas coisas como o presente: por conseguinte, a doença parece  afetar sobretudo a memória".(pg 42);
" Se Schopenhauer ainda experimentava, diante da austeridade crítica de Kant, uma espécie de pavor que logo iria superar, em compensação, viu-se seduzido desde o início pela teoria das idéias platônicas, modelos imortais das coisas perecíveis,Platão continuaria a ser sempre para ele o divino Platão." ( pg 58);
" Assim, Platão é associado a Kant e tem mesmo precedência sobre ele, na primeira concepção  da filosofia de Schopenhauer. Em geral, observa-se nele, durante todo o  período de estudos, ao lado da tendência inata á observação pessimista, uma necessidade de contemplação ideal á qual, mais tarde, ele satisfaria com sua teoria das artes". (pg 58);
" O  princípio da razão suficiente, objeto do primeiro escrito de Schopenhauer, não passa, no fundo, da regra mais geral da  construção filosófica.
Aplicada ao mundo exterior, ele se confunde com o princípio da causalidade. Nenhum fato se produz no mundo sem que exista uma razão suficiente  para isso, e é procurando essa razão que se chega a compreender o fato. Na esfera  de nossos conhecimentos teóricos, nenhuma afirmação  é legítima a não ser que contenha em si mesma maiores chances de verdade que a afirmação contrária".(pg 64);
" O que distingue o homem dos outros animais, é a razão, a faculdade da abstração que traz consigo o dom da linguagem" (pg 66);
" Além das representações sensíveis,  que o homem partilha  com os animais, ele também pode alojar em seu cérebro- que, sobretudo para isso tem um volume superior-algumas representações abstratas, ou seja, deduzidas das precedentes. Essa representações foram chamadas de conceitos porque cada uma delas compreende em si, ou antes, sob si, inumeráveis indivíduos dos quais ela é a concepção coletiva. È possível também defini-las como representações extraídas de representações" (pg 67);
" O conhecimento, mesmo sensível, é, segundo ele, antes demais nada, obra da inteligência, para a qual os sentidos só servem de  instrumento.
" É preciso que o entendimento crie, ele próprio, em primeiro lugar, o mundo objetivo. Não é o mundo que entra pronto em nossa cabeça pela porta dos sentidos e pelas aberturas dos órgãos . Os sentidos não fornecem nada além de matéria bruta que o entendimento transforma inicialmente, por meio das formas simples de espaço, tempo e causalidade, em percepção objetiva de um mundo material regido por leis. Portanto, nossa percepção cotidiana, nossa percepção em pírica, é uma percepção intelectual". Kant poderia assinar esse trecho. Em suma, a doutrina da primeira obra de Schopenhauer, apesar de algumas reservas de detalhes, era puro Kantismo" (pg 68);
Calma, meus queridos, amanhã comentaremos mais!

terça-feira, 4 de dezembro de 2012


 Continuação da Resenha de Adolphe Bossert e sua obra: "Introdução a Schopenhauer", traduzido para o Português por Regina Schopke e Mauro Baladi e editado pela editora Contraponto em 2011_ (segunda parte).   





Aquiles, neste sentido, não se tornou um herói por causa de sua “bela morte” ( a chamada  morte heroica), mas por causa de sua vida, ou não ter jamais  trapaceado consigo mesmo, por ter-se mantido íntegro e coeso, fiel a si mesmo, por ter enfrentado sem temor ,ou mesmo com algum, mas de pé e sem se acovardar tanto a vida quanto a morte” (PG. 9);
“O herói é simplesmente aquele que ensina, por seu próprio exemplo, que é possível ser livre, é possível ser senhor de si, não se curvando jamais, nem por toda a riqueza e o  prestígio do mundo. A glória da eternidade é a única que lhe cabe; e esta só se conquista ao se viver de verdade e sem trair a própria natureza.” (PG. 9);
“Dentre esses encontra-se o filósofo alemão Arthur Schopenhauer(1788-1860), que, como Aquiles, morreu  honrosamente num campo de batalha e, de certo, numa guerra mais poderosa e nobre que qualquer outra guerra travada pelo pensamento contra a ignorância que escraviza a humanidade”. (PG. 10);
“Apesar da inegável influência que o pensamento de Schopenhauer  exerceu sobre os mais diversos escritores e pensadores- como Nietzsche  Wittgenstein, Freud, Thomas Mann,Borges e até mesmo Machado de Assis-, não são muitos os que conhecem verdadeiramente a sua obra. Ele, que atacou tão duramente Hegel e toda a filosofia acadêmica da sua época (por considerá-la essencialmente estéril e até mesmo perniciosa para as mentes mais brilhantes), acabou, como não poderia  deixar de ser, atraindo a antipatia de muitos de seus contemporâneos  o que o ajudou a permanecer por longo tempo no ostracismo.No entanto, Schopenhauer jamais se deixou intimidar pelos comentários maldosos  e depreciativos sobre seus escritos. Assim, como todo grande pensador, ele não faz concessões para ser aceito e apreciado nos meios intelectuais , sendo fiel apenas á filosofia e a si mesmo. “( PG.10).
“ Seu pensamento, sempre citado, nos dicionários e Histórias da Filosofia, como essencialmente pessimista, nos surpreende pela clareza (pouco comum nos alemães como diz o próprio Schopenhauer) e também por apresentar um estudo inusitado sobre a felicidade ou, mais exatamente, sobre a possibilidade de se atingir alguma plenitude nesta vida”(PG 10);
“ Sim, uma “ arte de ser feliz(que Schopenhauer designa pelo nome de “Eudemologia”, ou “Eudemonismo”) não nega nem contradiz, como pode parecer, a sua ideia  central de que a vida é dor e sofrimento( com algumas breves pausas de alegria).Mas é claro que termina por suscitar uma reflexão mais profunda acerca  do próprio sentido do pessimismo Schopenhaueriano, já que, dentre outras coisas, o célebre “ mestre do pessimismo” ( como foi muitas vezes chamado) defendia que devemos abrir todas as portas quando a felicidade se apresenta, porque ela nunca deve  ser considerada inoportuna. (PG 11);
“Isso quer dizer, em outras palavras, que Schopenhauer não nega que existam verdadeiras alegrias nesta vida. Para ele, porém, elas são sempre mais fugazes que as dores. Neste ponto, em especial, ele concorda com Aristóteles, quando este afirma que a verdadeira felicidade consiste basicamente na ausência da dor. Por mais intensa que seja qualquer alegria, a presença da dor sempre a ultrapassa, segundo o filósofo alemão. Eis porque, para Schopenhauer, uma arte de ser feliz deve nos ensinar a reconhecer tudo o que fatalmente provocará nosso sofrimento, independentemente dos nossos desejos e aspirações. Aliás, a questão é ainda mais profunda; o desejo, sem o governo da razão, é a causa maior das nossas maiores angústias e decepções, em nada contribuindo para a nossa felicidade. Digamos que, por alguns instantes de prazer, muitos se arriscam anos de tormento; é isto que Schopenhauer gostaria de mostrar e de ensinar a evitar- o que, em parte, não é muito diferente do alerta de Spinoza, que, em sua ética, nos expõe os riscos dos maus encontros, das paixões tristes e despotencializadoras. Mas, sem dúvida, Schopenhauer radicaliza a questão e entende que só a cessação da vontade pode, de fato, permitir que se tenha alguma paz de espírito nesta vida; (pg 11);
“ È assim que, independentemente de ser um pessimista e, de fato, mostrar-se um tanto indisposto em relação á vida( o que , no fundo, revela mais sua indisposição em relação aos próprios homens, ou , mais exatamente, aos caminhos traçados pela humanidade, posto que é isso que tem tornado a vida tão irrespirável e miserável), Schopenhauer não deixa de ser genial e brilhante, não sendo outra a razão pela qual o próprio Nietzsche o chamou de “ o educador”, aquele que pode verdadeiramente nos ensinar algo de valor, para a nossa vida.( PG 12);
“ E, afinal de contas, Schopenhauer não está tão equivocado quando diz que as paixões podem nos escravizar de modo irremediável. Há, de fato, que ser senhor de si mesmo para não se tornar um escravo delas, já diziam os estoicos gregos. O meio-termo, neste caso, como em quase tudo, seria o melhor caminho, diria Aristóteles( e assim, trata-se mais de governar as paixões do que de extirpá-las), embora Schopenhauer, neste ponto, não concorde com ele e proponha o abandono completo das paixões mundanas e de tudo o que desvia a razão de seu caminho para uma existência superior ou mais digna. E isso só é possível , segundo Schopenhauer, se rompermos com a cadeia ininterrupta dos desejos que leva os homens a viverem buscando,sem desejos que leva os homens a viverem buscando, sem cessar, prazeres fugazes e inconstantes; prazeres que ora fazem sofrer  por não se realizarem, ora desencadeiam outros desejos tão logo sejam satisfeitos, e, assim, ao infinito. (pg 13);”
“Pois bem:  dito isso, voltemos a falar um pouco mais do próprio  conceito de pessimismo.Sem dúvida, as conclusões de Schopenhauer acerca  da miséria da existência e também da necessidade de supressão da vontade( única maneira, para ele, de se atingir uma  duradoura paz de espírito) fazem dele um pessimista. Mas, a despeito da negatividade deste conceito, que apareceu primeiramente entre os ingleses, mas encontrou sua melhor expressão na filosofia de Schopenhauer, o pessimismo nada mais é do que uma reação vigorosa á concepção leibniziana de que vivemos no melhor dos mundos possíveis”. (PG 14);
“ Ainda assim, independentemente suas próprias considerações, é inegável  que Schopenhauer também foi movido  por uma grande e incontrolável paixão: a paixão pelo pensamento, a paixão pela filosofia. Sim é fato que, para ele, existe uma diferença de natureza entre as paixões mundanas e o amor do filósofo pela verdade e pelo conhecimento”. Pg 15;
“ No entanto, no fundo de tudo o que nos move está a paixão, essa chama, essa força vital  que não nos permite, nem que queiramos, desviar atenção do  nosso objeto do amor. Para o bem ou para o mal, a isso chamamos “ paixão”, e não é sem razão que filósofos como Spinoza, o barão de Holbach, Jean- Marie Guyau e Nietzsche não a veem como um sentimento(pulsão, afeto etc), negativo e perigoso, a não ser quando ela se fixa em algo que nos despotencializa , nos enfraquece.
“Nesse caso, como pensa o próprio Spinoza, a qualidade do nosso amor é medida pela qualidade do objeto que amamos. È assim que nossas paixões podem ser alegres ou tristes, ou  com os sublimes. “( pg 15).
“De fato, Schopenhauer é um homem austero, duro, ás vezes até mal-humorado, mas também é  aquele que passeia  alegremente todos os dias com seu cão e que defende que 90% da nossa felicidade residem na saúde, deixando aos homens e, sobretudo, aos  filósofos do futuro a lição de que é preciso cuidar tanto do corpo quanto do espírito. È assim que, pessimista ou   niilista, Schopenhauer continua sendo o gram  mestre da humanidade” (pg 23);
“ Um sistema filosófico pode ser considerado sob dois pontos de vista: ele é ao mesmo tempo a consequência dos sistemas  que o precederam e o produto do gênio individual de um filósofo.À primeira vista, parece que os sistemas procedem uns dos outros por uma espécie de desenvolvimento orgânico e quase ine vitável. Aqui, porém, não mais  que outras áreas, a liberdade humana não abdica de seus direitos. Schopenhauer não teria sido o que foi se não tivesse vindo depois de Kant: mas sua doutrina também não se justificava sem a natureza de sue espírito e as circunstâncias de sua vida. Nesse aspecto, não existe diferença alguma entre história da filosofia e a história literária.” (PG.25);
“ Schopenhauer  que teve fama apenas tardiamente, não viveu o bastante para publicar uma edição completa de suas obras. No entanto, ele se preocupava muito com a forma pela qual a posteridade iria conhecê-lo. Havia nascido escritor, e para ele um pensamento só se completava quando encontrasse sua expressão na linguagem Schopenhauer indicava a ordem na qual sues escritos devem ser classificados” (PG. 26);
 “ Em 1873-1874, Frauenstaedt publicou a primeira edição das obras de Schopenhauer” (PG.26);
“ A filosofia de Schopenhauer foi objeto de um estudo detalhado e crítico na História da filosofia moderna, de Kuno Fischer. Na França, ela foi inicialmente julgada do ponto de vista do ecletismo espiritualista que ainda reinava em meados do século XIX. Ao mesmo tempo, A revista Germânia apresentava alguns fragmentos de tradução. Por fim, em 1870, Challemel-Lacour, que conhecera Schopenhauer em Frankfurt, fixou definitivamente a atenção sobre ele com um artigo eloquente que penetrava o cerne de sua doutrina”. (PG. 26);
“Schopenhauer escreveu pouco; ele se gabava de ser um oligógrafo. Mesmo sua correspondência é pouco  extensa, em parte composta por instruções dadas seus discípulos. As publicações parciais, que tiveram início logo depois  de sua morte, foram condensadas em duas coletâneas principais, embora ambas incompletas , que se complementam: a de Schemann, e a de Grisebach” (pg 27).
 * ( Escritor bissexto);
“ Na principal obra  de Schopenhauer  há um longo capítulo sobre a hereditariedade moral. Nenhum filósofo ou naturalista jamais duvidou de que as características físicas dos indivíduos, assim como as das espécies, sejam hereditárias, e a experiência de todos os dias o comprova. Porém, será que o mesmo acontece com tendências, aptidões e tudo aquilo que não está ligado essencialmente á forma do corpo?Pode-se dizer, de maneira absoluta, que “ filho de peixe, peixinho é, e que “tal pai, tal filho”? Schopenhauer não somente afirma isso como também pretende determinar, na transmissão das qualidades morais, a participação de cada um dos progenitores. O pai fornece o elemento primeiro  e fundamental de todo ser vivo: a necessidade de agir, a vontade da mãe deriva  a inteligência, aptidão secundária. Schopenhaer não tem dificuldade para encontrar na história fatos que justifiquem sua teoria; e simplesmente descarta os que a contradizem”(PG. 29);
“ Mas, sem dúvida, ele só pensava em si mesmo quando dizia: “ Que cada um comece por se observar , que reconheça  suas tendências e paixões, suas falhas de caráter, e fraquezas, seus vícios assim como seus méritos e virtudes- se os tiver”. (PG. 29);
“ os ascendentes paternos de Schopenhauer, tão longe quanto se possa chegar em sua genealogia, eram homens de vontade forte, com certa tendência para a excentricidade. A família tinha origem holandesa. O  avô era proprietário rural nos arredores de Dantzig. Sofreu alguns revezes da sorte, em parte em decorrência das revoluções políticas que fizeram com que a antiga cidade hanseática passasse da suserania dos reis da Polônia para o domínio da Prússia. Já viúva, a avó foi declarada louca, e tornou-se necessário atribuir-lhe um tutor judicial. Dos quatro filhos, o mais velho não tinha vontade própria: O segundo também se tornou uma personalidade fraca em consequência de uma vida de excessos.” (PG. 30);O quarto, Heinrich Floris, pai do filósofo, associou-se ao terceiro irmão para fundar em Dantzig uma casa comercial que logo se tornaria próspera. Era um  homem grande e forte, tinha boca larga, nariz arrebitado, queixo protuberante e problemas de audição”. (pg 30);
“Duas qualidades que não se podiam negar a Heinrich Schopenhauer eram uma vontade íntegra e firme- que não recusava um debate, embora terminasse  sempre por se impor- e uma amplitude de ideias muitas vezes presente em quem se dedicava ao grande comércio marítimo”.(PG. 30);
“Ele fizera seu aprendizado em Bordeaux e em seguida viajava pela França e pela Inglaterra. Era cosmopolita, mas, se pudesse ter escolhido uma nacionalidade, teria se tornado inglês. Todos os dias lia o Times. Antes dele um comerciante e que o chamaria de Arthur, por esse nome ser o mesmo em todas as línguas. No decorrer de suas viagens, assistira a uma inspeção de tropas,de Frederico II, em Potsdam, e atraíra a atenção do rei com seu ar de fidalgo. (PG 31);
“ Arthur tinha cinco anos quando a família, fugindo da ocupação prussiana, estabeleceu-se na cidade livre de Hamburgo. Sua única irmã, Adele, nasceu quatro anos depois, em 1797.No mesmo ano, o pai começou a ocupar-se da educação do filho. Heinrich Schopenhaer queria fazer de Arthur um fidalgo como ele, atento e dotado de sentido de justiça,avaliando as coisas por si próprio e sabendo se virar no mundo.Se ele preferia a carreira comercial a qualquer outra, não era por hábito ou preconceito, mas por razões precisas, pelo conforto e a  liberdade que ela proporcionava, o exercício que oferecia para todas as capacidades humanas. Havia dois meios de se preparar para isso:  o estudo de línguas e as viagens. Também estavam ali, segundo ele, os dois fundamentos de toda educação individual e a liberal. “ È necessário que meu filho”, dizia ele,”aprenda a ler no livro do mundo” Pg 30.
“ De acordo com a natureza da nossa inteligência, as ideias abstratas devem nascer de nossas percepções estas, portanto, devem preceder àquelas ”(PG 34);” Ao contrário, na educação artificial- que consiste em fazer dizer, em fazer aprender e em fazer ler-, a cabeça do estudante é recheada de ideias antes que ele se ponha em contato com o mundo” (PG 34);
“ A educação produz, assim mentalidades mal forjadas. O jovem depois de ter aprendido muito e lido muito, entra no mundo como uma criança perdida, ora totalmente inquieto, ora loucamente presunçoso. Ela fica com a cabeça cheia de ideias que se esforça por aplicar, mas que aplica quase sempre de maneira desastrada. Este o resultado de uma educação que põe a consequência adiante do princípio, ou seja, que segue um caminho contrário ao do desenvolvimento natural do nosso espírito.”(PG 34);
“ Arthur Schopenhauer, embora desfrutando de suas jovens experiências e desse primeiro olhar que lhe era dado lançar sobre o mundo, começava a manifestar gosto pelos estudos literários. Ele adorava ler os poetas e se aplicava no aprendizado de latim- tanto quanto lhe permitia o pouco tempo que  o programa da escola destinava as línguas antigas. Seus professores declaravam unanimemente que ele fora feito para a carreira de letras. Heinrich Schopenhauer- primeiro espantado, depois contrariado- talvez não tivesse resistido ao desejo do filho” se, em sua mente, a ideia de vida literária não estivesse indissoluvelmente ligada á da pobreza”.(PG 35)
“ Todas as vezes que dois homens se aproximam, é necessário que um dos dois dê o primeiro passo”. (PG36);
“ Admito  que o tom cerimonioso te aflija, mas ele é necessário á ordem social.” (PG 36);
“ Embora eu tenha pouco interesse pela fria etiqueta, gosto ainda menos das maneiras rudes das pessoas que só procuram agradar a si próprias”; (PG 36);


“Quando foi dada a Aquiles a chance de escolher entre ter uma vida longa,confortável e tranquila ou morrer nos campos de batalha,ele simplesmente não escolheu. Não escolheu porque, no fundo,não se tratava de uma escolha, e sim de fazer aquilo  que determinava a sua natureza- e sua natureza  exigia que  lutasse até o fim”. PG 9;
" Assim, o homem de gênio, em geral propenso á melancolia, mostra vez por outra essa serenidade particular que só a ele é possível , que paira sobre sua fronte como um raio de luz, e que se deve ao fato de que o seu espírito sabe se identificar completamente com o mundo exterior".(pg. 38);
" Um homem que encurva as costas sobre a mesa sua escrivaninha parece um sapateiro remendão disfarçado". (PG.39);
" Seu pai morreu em 20 de Abril. Não se sabe se caiu ou se jogou de um celeiro no canal que passava atrás da casa. As circunstâncias da morte jamais foram esclarecidas.Schopenhauer assegura- e podemos acreditar em sua palavra- que jamais houve no mundo um empregado de comércio pior que ele. Qualquer pretexto era bom para se furtar a um trabalho que o repugnava. A única coisa que o interessava nos últimos meses do inverno de 1805 eram as conferências que o dr. Gall foi fazer em Hamburgo, sobre frenologia".(PG.41);
* Franz Gall (1758-1828), médico alemão que criou a frenologia, pseudociência que estuda o caráter e as faculdades intelectuais do indivíduo pelo formato do crânio.
" Seu pai morreu em 20 de Abril. Não se sabe  se caiu ou se jogou de um celeiro no canal que passava atrás da casa. As circunstâncias da morte  jamais foram esclarecidas" (PG 41);
"O certo é que havia algum tempo se observava em Heinrich Schopenhauer uma singular fraqueza de memória; ele não reconhecia mais os amigos, falava com eles como se fossem estranhos". (PG 42);
" Na maioria das vezes, os loucos não se enganam no conhecimento daquilo que está imediatamente presente; suas divagações se relacionam sempre a coisas ausentes ou passadas, e, indiretamente, á ligação dessas coisas com o presente: por conseguinte, a doença parece  afetar sobretudo a memória"( PG 42);
" Se Schopenhauer ainda experimentava diante da austeridade crítica de Kant, uma espécie de pavor que logo iria superar, em compensação viu-se seduzido  desde o início pela teoria das idéias platônicas, modelos imortais das coisas perecíveis. Platão continuaria a ser sempre para ele o divino Platão". (PG 58);
" Assim, Platão é associado a Kant e tem mesmo precedência sobre ele, na primeira concepção da filosofia de Schopenhauer . Em geral, observa-se nele, durante todo o período de estudos, ao lado da tendência inata á observação pessimista, uma necessidade de contemplação ideal á qual , mais tarde, ele satisfaria com sua teoria das artes" ( PG. 58);
" O princípio da razão suficiente, objeto do primeiro escrito de Schopenhauer  não passa, no fundo, da regra mais geral da construção filosófica.Aplicada ao mundo exterior, ele se confunde com o princípio da causalidade. Nenhum fato se produz no mundo sem que exista uma razão  suficiente para isso, e é procurando essa razão que se chega a compreender o fato.. Na esfera de nossos conhecimentos teóricos, nenhuma afirmação é legítima a não ser que contenha em si mesma maiores chances de verdade que a afirmação contrária" (PG. 64);
" O que distingue o homem dos outros animais, é a razão, a faculdade da abstração que traz consigo o dom da linguagem". (PG. 66);
" Além das representações sensíveis , que o homeme partilha com os animais, ele também pode alojar em seu cérebro- que, sobretudo para isso, tem um volume  superior-algumas representações abstratas, ou seja, deduzidas das precedentes. Essas representações foram chamadas de conceitos porque cada uam delas compreende em si, ou antes, sob si, inumeráveis indivíduos dos quais ela é concepção coletiva. È possível também defini-las como representações extraídas de representações. " (PG 67);
" O conhecimento, mesmo sensível, é, segundo ele, antes de mais nada, obra da inteligência, para a qual os snetidos só servem de instrumento. " È preciso que o entendimento crie, ele próprio em primeiro lugar, o mundo objetivo. Não é  o mundo  que entra pronto em nossa cabeça pela porta dos sentidos e pelas aberturas dos órgãos. Os sentidos não fornecem nada além de matéria bruta que o entendimento  transforma inicialmente, por meio das formas simples de espaço, tempo e causalidade, em percepção objetiva de um mundo material regido por leis. Portanto, nossa percepção cotidiana, nossa percepção empírica, é uma percepção intelectual".
Kant poderia assinar esse trecho. Em suma, a doutrina da primeira obra de Schopenhauer, apesar de algumas reservas de detalhes, era puro Kantismo". (PG 68);






sábado, 17 de novembro de 2012

Resenha da grande obra de schopenhauer:" Introdução á Schopenhauer" , da editora Contraponto!





B ossert, Adolphe, 1832-1922;
Introdução a Schopenhauer; Adolphe Bossert; tradução Regina Schopke, Mauro Baladi-Rio de Janeiro: Contraponto, 2011;
Resenha do livro “Introdução a Schopenhauer, editora Contraponto, Rio de Janeiro, RJ;

  • “Cada vez que um homem é concebido, torna-se a dar corda no relógio da vida, e ele retorna o estribilho fastidioso que já tocou tantas vezes, compasso por compasso, com variações insignificantes. Cada indivíduo, cada rosto humano, cada vida humana, não passa de um sonho sem duração do espírito infinito que anima a natureza, do querer viver indestrutível.” (p-237; 238);
“Tal é a vida humana em sua aparição geral e comum”. Fugidia como é, ela ainda poderia nos agradar se ao menos nada exigisse de nós. Porém é necessário que a preenchamos com atos. Cada ser, por sua conta, é uma personificação do querer viver universal. Ora, querer viver é fazer esforço. Quando o esforço é contrariado, ele se traduz em sofrimento; quando dá resultado, proporciona satisfação; mas a satisfação dura pouco, porque é logo seguida de novo esforço; essa continuidade de esforços, mesmo que fossem todos bem-sucedidos, causa um estado de inquietude que também é um sofrimento. Portanto querer viver, fazer esforço e sofrer, tais são as três fases invariáveis de toda existência.
O sofrimento é tanto maior quanto mais esclarecida é a inteligência, mas ele surge desde os graus inferiores de animalidade. Tudo aquilo que sente está destinado a sofrer. Pg238;
ü  “Assim, a vida oscila entre a dor e o tédio, pior que a dor”. A satisfação é apenas uma libertação; ela faz calar momentaneamente a necessidade, que logo renasce sob outra forma. Só desfrutamos da satisfação indiretamente, pela lembrança da privação passada. O sofrimento, pelo contrário, apresenta-se a nós sem intermediário. Todo prazer, em essência, é negativo. Só a dor é positiva: e quando procuramos escapar dela pela ausência de desejo, não temos outro refúgio além de um estado de langor, uma espera sem objeto, o tédio. (pg 239);
ü  “O erro dos homens comuns é acreditar que a causa de seu sofrimento está fora deles. AH! se determinada circunstância pudesse ter sido outra, se determinado acaso pudesse não ter produzido, uma desgraça seria evitada. Mas o destino tem cem meios de agir sobre nós, se nós lhe escaparmos por um lado, ele torna a nos pegar por outro. Cada um de nós tem em si certa capacidade de sofrer: é preciso que ela seja preenchida. Um ferido por grande dor chega a desprezar os pequenos aborrecimentos; outro, que se acredita feliz, atormenta-se por contrariedades insignificantes: um terceiro, na falta de males reais, cria alguns imaginários. Na realidade, cada qual paga seu tributo, por atacado ou em dinheiro miúdo. (pg 240);
<ü  “quanto aos otimistas declarados, ele os convida, para se convencerem de que o mundo é ruim, a visitar os hospitais, os leprosários, as prisões e as pocilgas onde se esconde a miséria. Esquece que nesses mesmos lugares se mostra também a virtude que ele próprio considera a primeira de todas, a simpatia humana, a piedade; (pg 241);
<ü  “A felicidade não se mede, não se quantifica; ela é um sentimento, e o sentimento não tem extensão no espaço”. Dois sentimentos só podem ser comparados pelo grau de intensidade naquele que os experimenta; em si mesmos, eles não têm qualquer valor tangível. Portanto, é impossível provar que os bens levam vantagem sobre os males, porque não se trata de um fato da experiência ou do cálculo (pg 241);
ü  Schopenhauer o chama de vontade; ele o chamaria também de vida. A vida, portanto, não é o esforço, é o estado natural, é a expansão livre, espontânea e irresistível dos seres. (pg 242);
ü“Quando o egoísmo se torna agressivo, quando a vontade de um indivíduo irrompe no domínio no qual se afirma a vontade de outro indivíduo, existe injustiça, sob qualquer forma que ela se produza, desde a violação da propriedade até o atentado contra a pessoa. (PG 256);
“Como, segundo Schopenhauer, na transmissão das qualidades morais, pela hereditariedade, a vontade vem do pai e a inteligência, da mãe, na realidade, é o pai que sobrevive nos descendentes.”(pg 247);
“O primeiro passo de entrada na vida, é o primeiro olhar que os futuros pais trocam entre si”. (PG 250);
“A paixão é cega; o amor tem uma venda nos olhos. No entanto, o extinto, iluminado por não se sabe qual luz interior, escolhe com um tino maravilhoso aquilo que pode satisfazê-lo” (pg. 250);
ü “Cada um dos dois amantes, procura no outro, as qualidades que faltam nele próprio, a fim”.
<ü  de que o ser que deles se originar  possua, em um conjunto harmonioso, todas as perfeições que eles podem lhe conferir.”(pg. 251);
<!--[ü  A mulher também sabe que só pode transmitir ao filho a inteligência, ao passo que a vontade provém do pai. Portanto, o que a cativará em um homem é a firmeza, a coragem, e talvez também a bondade e a equidade.”
<ü  “A falta de inteligência não a deterá: todos os moralistas têm observado que a tolice não importuna as mulheres ( pg 251);
<!-ü  “O puro instinto sexual é menos vivo que a paixão exclusiva. Ele também é mais vulgar, porque tende á conservação da espécie apenas pela quantidade, sem levar em conta a qualidade. Mas pode ocorrer entre um homem e uma mulher, entre suas qualidades físicas e morais, uma concordância excepcionalmente feliz, obra profunda e misteriosa da natureza, inconcebível para o nosso espírito como tudo aquilo que está ligado á coisa em si.” PG 251;
ü“só a espécie tem uma vida infinita e, por conseguinte, desejos infinitos; também apenas ela tem satisfações e dores sem fim”.
<!ü  “A vontade de viver se manifesta, no seu grau mais humilde, na conservação do corpo, nos esforços que cada ser faz para assegurar a manutenção de sua existência e o funcionamento de seus órgãos. Ela dá um passo a mais quando, ultrapassando os limites da existência particular, tende a  se perpetuar na série de gerações futuras. Eis aí a afirmação da vontade na ordem física. (pg 255);
ü  Disso resulta “que cada indivíduo, por menor que ela seja um nada no espaço sem limites, considera-se, no entanto, o centro do mundo e se preocupa, antes de tudo, com sua conservação e seu bem-estar.” (PG 255);
<ü  Quando o egoísmo se torna agressivo, quando a vontade de um indivíduo irrompe no domínio no qual se afirma a vontade de outro indivíduo, existe injustiça, sob qualquer forma que ela se produza, desde a violação da propriedade até o atentado contra a pessoa. A injustiça cometida demanda a intervenção da sociedade, que se vê ameaçada como um todo pelo dano causado a um de seus integrantes. A injustiça acarreta o castigo, não como uma retribuição que se deve á falta ou ao crime, mas como meio de prevenir seu retorno. (pg 256);
<ü  “Schopenhauer só admite o castigo com finalidade preventiva, seja para desarmar o culpado, seja para advertir aqueles tentados a imitá-lo”. “pg256”.
ü “A sociedade não tem o direito de retribuir o mal com mal, de acrescentar sofrimento a outro sofrimento; mas ela tem o dever, assim como o direito, de diminuir o sofrimento na medida do possível e, na mesma medida, de impedir o mal que poderia advir. (pg 256);”
<ü  “A sociedade, ou o Estado, que é a sociedade organizada, é um meio pelo qual o egoísmo armado de razão escapa ás consequências de suas próprias faltas, cada um contribui para o bem de todos, sabendo que seu próprio bem está aí incluído”. O estado, por meio das forças humanas que reúne em si, reduz cada vez mais o resto da natureza para seu serviço. Se atingisse inteiramente o seu objetivo, ele poderia, portanto, chegar a expulsar do mundo o mal sob todas as suas formas, e assim construir para nós uma terra das maravilhas ou coisa parecida. Mas o estado sempre está muito longe de seu objetivo: além do mais, mesmo que ele o atingisse, não poderia suprimir a multiplicidade dos males inseparáveis da vida e que a mantém no sofrimento; por fim, se todos os males viessem a desaparecer, restaria ainda o tédio, que logo tornaria o lugar deles, de modo que a dor não perderia nenhuma de suas posições. (PG 256);
ü “O Homem, por mais pervertido que seja pela paixão ou pela inveja, ainda sente vagamente que a mesma vontade, carregando consigo as mesmas dores, se agita dentro de e em cada um de seus semelhantes (pg 257);”
<ü“A identidade originária de todos os seres, que se revela vagamente á consciência do homem injusto, surge, no estado de conhecimento claro, aos olhos daquele que soube dominar o impulso cego de sua vontade”. A negação, tanto quanto a afirmação da vontade, tem uma gradação, desde a simples justiça até o espírito de caridade e de abnegação (PG 258);
<ü   A justiça é uma virtude puramente negativa: a bondade é superior á justiça; é ativa e previdente. Ela soma á justiça a benevolência e a graça. Levá-nos a recursar um serviço que nos é devido, ou que nos é oferecido, e a fazer os outros tirarem proveito daquilo que nos pertence, até o ponto de nos privarmos por causa deles; (pg 258);
<ü“O que muitas vezes desacredita a bondade é que ela se confunde com a fraqueza. Mas pode se harmonizar com uma manifestação muito enérgica da vontade; apenas ela apresenta como objetivo para a vontade o bem de todos; ela ergue como princípio que” nosso verdadeiro eu não reside apenas em nossa pessoa, nesse fenômeno que somos, mas em tudo aquilo que vive”. Portanto, a bondade toca de perto a abnegação; ela é estimulada pelo espetáculo do sofrimento universal” pg 258;
ü  ““ A piedade, “ que faz sua miséria do mundo” , equivale á negação da vontade do ponto de vista moral,ou seja, ao sacrifício da vontade individual nas relações da vida e em última consequência, ela chega a negar a vontade no sentido metafísico, a abster-se completamente do querer. ;( pg 256);
<ü  O homem no qual a vontade chegou a esse último grau de depuração possui uma nova ideia da vida. Ele não tem mais diante de si essa alternância de bens e males com os quais se forma cada existência particular e a qual se liga exclusivamente o olhar daquele que ainda é escravo do egoísmo. (pg 259);
ü “Mas o suicídio, longe de ser uma negação da vontade, ao contrário, é sua afirmação mais enérgica. O homem que mata a si mesmo nada pediria além de viver se a vida fosse tal como ele a deseja; ele mostra mesmo, por sua resolução violenta, como estava ligado a esses bens cuja privação lhe é insuportável; “(pg 260);
ü A felicidade dos homens comuns consiste na alternância entre trabalho e gozo, que pra mim são a mesma coisa. È por isso que a vida dos homens da minha espécie é necessariamente um monólogo. (PG 262);
<ü  Schopenhauer é o homem de sua doutrina. Ele jamais teve outro objetivo, além de formulá-La, explicá-la e difundi-la, sendo ele mesmo sua representação viva. (pg 263);
<!ü Schopenhauer é um poeta filósofo; ele tem mais experiência que raciocínio, e ainda mais imaginação que experiência. (pg 265);
<ü  O filósofo tem um ponto de vista a partir do qual examina o mundo, e que depende da natureza de seu espírito ou das influências que ele sofreu. (pg 267);
ü  Não é assim que procede Schopenhauer: ora ele é Kantiano, ora platônico, e apenas na teoria da vontade e em uma parcela da teoria das artes é totalmente ele próprio. (267);
ü  Schopenhauer quer que a espécie, assim como a vontade da qual ela emana,esteja situada fora do tempo. O indivíduo morre, a espécie subsiste. (pg 269);
<ü  A espécie, o gênero e o indivíduo serão outra coisa além de categorias do nosso espírito? Mas se a espécie desaparece, a Ideia, não sendo mais representada por nada, deve desaparecer também. A doutrina revela aí uma série de inconsistências, e talvez certo desdém pela verdade científica. ( pg 269);
ü Schopenhauer não se cansava de dizer que ele não pretendia sair do domínio da experiência, que só queria conhecer aquilo que existe, sem se inquietar em saber porque existe. Segundo Schopenhauer, foi Aristóteles quem forneceu, em seu sistema do mundo, a base sobre a qual o teísmo se estabeleceu durante séculos. (pg 312);O homem que sempre viveu no ceticismo termina por se habituar e por se alojar comodamente nele; o verdadeiro cético, aquele no qual o ceticismo atinge toda a sua profundidade, é o crente desiludido. Nesse grau, ele está pronto para abraçar qualquer doutrina nova, e de preferência adota-se aquela que se anuncia com maior autoridade. (PG 322);

ü  Schopenhauer é honesto tanto em seu estilo quanto em pensamento. Há tão poucos escritores honestos, que, para falar a verdade, caberia desconfiar de todo homem que escreve. Só conheço um que, pela honestidade, é igual e até superior a Schopenhauer: Montaigne. [....]. Esses dois homens tem ainda outra característica em comum: uma serenidade de tipo particular, que se transmite ao leitor. (pg 342);
<ü  “Uma língua é uma obra de arte; é preciso manejá-la como artista. Ela é também nacional, uma herança dos ancestrais; é preciso abordá-la com respeito, tocá-la com precaução.”(pg 344);
ü  “Muitos livros servem apenas para montar como existem atalhos pelos quais podemos nos extraviar. Só é necessário ler quando a fonte viva do pensamento para de jorrar, o que pode acontecer ás melhores cabeças. Porém, rechaçar um pensamento pessoal e original para pegar um livro, isso é um pecado contra o Espírito santo; é voltar as costas á natureza para examinar um herbário ou uma paisagem em gravura.” (pg 347);
<ü  “Para o homem de Schopenhauer, a virtude suprema é a veracidade. Ele quer se conhecer e conhecer ao mesmo tempo a essência do mundo. Não se contenta como o espetáculo ofuscante das coisas que passam; ele olha para dentro de si, para surpreender nas profundezas de sua consciência o segredo da vida; (pg 347);