" A cor, a manifestação mais expressiva da vida na natureza, a cor que anima o olho do homem, que se irradia na superfície das plantas e dos minerais, que se manifesta de mil maneiras nos espaços do céu, é um dos fenômenos que mais atraíram a atenção dos pensadores e dos poetas. Eles queriam conhecer sua natureza própria, sua relação com a luz, seu modo de transmissão até o olho. Porém, por todo o período em que a ciência se confundiu com a filosofia, a observação científica ou pseudociêntifica praticamente não foi além de recolher e comparar as impressões que o homem recebia de maneira direta da natureza; e essas impressões dependiam necessariamente do caráter do observador, da mesma forma que as conclusões que ele tirava delas se atinham ao conjunto de seu sistema".(página 83);
" Assim, nas ciências físicas, e em particular na teoria das cores, desde Aristóteles até o fim da Idade Média, o progresso era quase imperceptível. Aristóteles , que viu na natureza tudo aquilo que um homem pode ver apenas com o auxílio dos sentidos, parece ter pressentido algumas descobertas que só se tornaram possíveis com os métodos de experimentação da ciência moderna".(pg 83);
" Porém, se tiramos a cor, tiramos, no mesmo lance, toda a visão das coisas,porque toda coisa visível só é vista por meio da superfície colorida" [...]
" Tudo aquilo que é vísivel no mundo só o é por causa de uma luz sombreada ou de uma sombra iluminada". (pg 84);
" A luz não é una, é múltipla, e se compõe de raios refratados de diversas formas e que, segundo o grau de refração , constituem a gama das cores. " (pg 86);
" A cor nada mais é que uma variação da luz, e aquilo que chamamos de luz é apenas a sensação luminosa que projetamos, por assim dizer, para fora de nós, e á qual atribuímos existência real". (pg 86);
"Assim, a cor é sucessivamente a luz obscurecida a sombra iluminada. " (pg 91);
" [...]A filosofia jamais teve relações com os compostos.Seu objetivo é a noção, a unidade na diferença. [....] A luz está fora da esfera das determinações físicas. O claro fixado sobre um corpo é o branco, que ainda não é uma cor. O escuro, materializado e especificado, é o negro. Entre os dois extremos se situa a cor. Ela é apenas a ligação entre a luz e a escuridão, e somente essa ligação específica produz a cor. " (pg 93);
" Assim, é a noção, uma entidade abstrata, que determina a solução de um problema científico. Não seria preciso que a natureza entrasse nos compartimentos que o filósofo lhe apresenta? Aliás, Luz, escuridão e cor são afirmação, negação e conciliação, tese, antítese e síntese, ou seja, uma dessas trilogias sobre as quais Hegel edifica seu sistema e que se sustentam umas das outras como os arcos superpostos de uma fachada gótica".(pg 93);
" Sem querer ofender Schopenhauer, é possível ter o espírito de honestidade em si e estou enganado quanto á natureza das cores, sobretudo quando ela só foi experimentada pela metade. Ele mesmo é uma prova disso, além de Goethe.". (pg 94);
" Schopenhauer dizia, como Rousseau, que seus melhores pensamentos lhe vinham caminhando. ele estava sempre munido de uma caderneta, na qual anotava suas observações á medida que a ocasião favorável as fizesse surgir.
Em cada artista, em qualquer gênero, tem um procedimento, um só, que lhe é inato, por meio do qual ele se apodera da natureza; que o dele era apreender a concepção primária ainda bem quente, por assim dizer, e inundá-la logo com um jato de fria reflexão para cristalizá-la e conservá-la. Inimigo do vago, fixava em poucas palavras precisas todo pensamento que lhe ocorria, deixando para desenvolvê-lo em página, e sem seguir uma ordem , os dois volumes manuscritos in-quarto hoje conservados na Biblioteca Real de Berlim, que contêm a substância de sua grande obra, o mundo como vontade e como representação". (pg 104): " Schopenhauer tinha travado relações com os artistas alemães em Roma; mas achou-se desde o início em completa oposição de ideias com eles. Seguia o gosto clássico em literatura e, em matéria de arte, era pagão, á maneira de Goethe. No círculo que frequentava, todos se declaravam românticos e patriotas, duas palavras que, no fundo, designavam a mesma coisa. A pa´tria que se invocava não era mais a estrangeira. A Santa Aliança fizera prevalecer outro ideal, e a literatura e as artes haviam seguido a evolução da política". (pg 113);
" A pátria que se sonhava em meados de 1820, era a velha pátria germânica da Idade Média, o santo Império Romano, com um imperador eleito, consagrado pelo papa, cercado por seus príncipes e dignitários laicos e eclesiásticos.(pg 113);" os artistas alemães que iam a Roma não se incluíam mais, como no século XVIII, na escola da Antiguidade. Eles copiavam doutamente as inexperiências dos pintores que o espírito do Renascimento ainda não tocara, aqueles que foram chamados de primitivos- embora eles próprios tivessem diante de si outros primitivos, cujos procedimentos aperfeiçoavam lentamente. " (pg 113);
" Schopenhauer não era homem de contornar qualquer obstáculo que encontrasse em seu caminho . Também não estava disposto a abandonar a menor parcela daquilo que chamava de seu direito". (pg 115);
" A perturbação momentânea que avassalou as finanças de Schopenhauer foi uma das causas que o levaram a buscar apoio e recursos no ensino universitário." (pg 119);
" Schopenhauer não era homem de contornar qualquer obstáculo que encontrasse em seu caminho. Também não estava disposto a abandonar a menor parcela daquilo que chamava de seu direito". (pg 115);
"Sabemos também que o derradeiro esforço da dialética de Hegel era encontrar a fórmula filosófica do estado prussiano, ao passo que Schopenhauer, proibindo-se qualquer alusão á política do dia, pretendia ensinar apenas para a " Humanidade de todos os tempos e de todos os países". Hegel dizia que a lei do desenvolvimento histórico era a propagação da liberdade no mundo, mas tinha o cuidado de acrescentar que o Estado, sendo uma forma da Ideia absoluta, devia ter sua representação material, una e intangível, na pessoa do soberano. Ele considerava a filosofia superior á religião, mas afirmava também que o fundador do Cristianismo era mais alta personificação de Deus na terra. Essas contradições entre o espírito do sistema e as aplicações que o mestre fazia dele só o vieram á luz mais tarde, e tornaram-se então a causa principal da dissolução da escola."( pg 120);
" Mas, naquele momento, Hegel tinha o apoio dos políticos e dos teólogos, e seu ensinamento difundido por seus discípulos, tinha a força de uma instituição de Estado". (pg 122);
Schopenhauer observa que seu próprio humor se suaviza no contato com a leveza italiana.ele se torna mais indulgente com as opniões dos outros;busca as distrações mundanas, das quais outrora fugira, -" Rio de mim mesmo quando passeio com um dominicano claro pelos jardins Boboli, e quando me surprendo a reclamar com ele da decadência dos conventos; ou quando, no salão brilhantemente iluminado de uma villa, faço a corte a uma inglesa".E, em carta posterior; " Eu estava sociável como não era há muito tempo; frequentava até a alta sociedade. Com isso, minha experiência e meu conhecimento dos homens foram ampliados, eesse tempo não foi de maneira alguma perdido pra mim. ver e conhecer é tão útil quanto ler e aprender. tive todo o tempo livre para estudar as obras de arte reunidas em Florença, e o povo italiano forneceu amplo material para minhas observações."(pg 124);
" Em maio de 1825, Schopenhauer foi bruscamente arrancado de seus estudos por um ridículo processo, que se arrastou havia quase quatro anos exigia sua presença em Berlim. Tratava-se de um fato que datava de sua precedente estada naquela cidade, e que remontava ao mês de agosto de 1821. Uma costureira pouco discreta, que ocupava um quarto na mesma casa que ele, um dia se instalara diante da sua porta para controlar as visitas que o filósofo recebia.Ele intimou-a a se retirar e, diante da recusa, empurrou-a com violência no corredor para onde dava o apartamento. A mulher alegou ter sido agredida por ele e arrastada pelo chão. deu queixa, o que de início só teve como resultado condená-la a pagar as custas do processo. Ela apelou.";(pg. 126);
Schopenhauer traçou, em 1826, o primeiro esboço de um de seus melhores escritos, os Aforismos sobre a sabedoria.
No ano seguinte, escreveu " Física astronômica", mais tarde capítulo de A vontade na natureza. Um artigo publicado em 1829 na Foreign review de Londres sugeriu-lhe o projeto de traduzir para o inglês as obras de Kant. Ninguém era mais qualificado que ele para tal empreitada, e não havia nenhuma fatuidade de sua parte ao escrever" Que talvez não se encontrasse, no espaço de um século, outra cabeça onde estivessem reunidos tanto Kantismo e tanto inglês quanto na minha". dois editores aos quais ele se dirigiu sucessivamente recuaram diante dos custos. Já sabendo inglês, francês, e italiano. ele tinha começado, em 1825 a estudar espanhol, traduziu o oráculo manual, do moralista Baltasar Gracian. Porém, mais uma vez, faltou-lhe a intermediação necessária como público- o editor- e a tradução só foi publicada depois de sua morte. ".(pg 128);
" Foi um erro de Schopenhauer acreditar, ou, antes, persuadir-se de que Fichte, Schelling, e Hegel tinham sido falsos intérpretes da doutrina de Kant: um terrível erro voluntário, porque Shopenhauer jamais se dera ao trabalho de refutar com seriedade seus três predecessores. ele se contentava em chamá-los de " os três grandes sofistas". Quanto a Hegel, em particular, desvencilhava-se dele com pouco esforço, declarando-o ilegível- o que era verdade, em certo sentido, e podia servir de justificativa para um simples leitor, mas não para um adversário. Se tivesse desejado olhar mais de perto, teria se convencido de que o idealismo de Fichte, Schelling e Hegel, não nenos que sua própria teoria do conhecimento, tinha raízes no criticismo de Kant."(pg 133);
" O ponto capital da filosofia de Kant é o caráter relativo e condicional do saber humano. Nosso conhecimento se compões de nossos juízos, e estes se fundamentam em nossas percepções. Ora, aquilo que percebemos não são as próprias coisas, mas a imagem das coisas que nossos sentidos nos transmitem. Em outras palavras, nosso saberé feito de aparências. Vemos tudo sob as condições do tempo e do espaço. que são como as formas de nossa sensibilidade. Um ser que vivesse fora do tempo e do espaço não perceberia nada do que percebemos. Pele mesma razão, tudo que está fora do tempo e do espaço- o eterno , o infinito, o absoluto- nos escapa, e todas as ideias que formamos sbre isso só podem ser quiméricas; é o " fruto proibido" do qual é preciso se abster. A filosofia desceu, como nos tempos de Socrates, do céu á terra. A metafísica não é mais uma construção ambiciosa, como a pretensão de abarcar a universalidade das coisas e explicar o mistério da criação. Ela se transforma " na ciência dos limites da razão Humana".
" A faculdade de conhecer se manifesta, segundo Kant, sob três formas sucessivas; em primeiro lugar, ela é sensibilidade ou faculdade de perceber; em seguida, inteligência ou faculdade de julgar; por fim, razão ou faculdade de coordenar os juízos e reduzí-los a um sistema. A sensibilidade, como primeira ma nifestação da faculdade de conhecer, não é puramente passiva; perceber já é agir.A matéria que osa seus órgãos lhe fornewcem, a sensibilidade apresenta seus moldes, que são as noções de tempo e espaço. ela configura e trasforma tudo que recebe, elapõe em tudo sua marca, sua assinatura, substitui o mundo real por um mundo de fenômenos que lhe pertence, que é obra sua , e que ela transmite a inteligência e a razão.
Nesse sentido, Kant pôde dizer que a razão humana cria o Universo. ele pretendia falar somente do universo sensível, do conjunto dos fenômenos que, para nós, substitui a universalidade das coisas. Seus sucessores tiveram apenas que apagar a distinção entre o mundo real e o mundo fenomênico para entrar no idealismo absoluto. ( trechos retirados da página 134);
o eu humano torna-se sujeito absoluto; ele contém virtualmente todo conhecimento e toda realidade. ele é a essência inteligível do mundo fenomênico.Os objetos sensíveis nãopassam de um limite que ele encontra fora de si,ou, antes, que opõe a si mesmo, mas que ele força incessantemente a recuar diante de si,á medida que sua infinita vritualidade se manifesta e se realiza nesse mundo. A baliza do desenvolvimento filosófico seria a absorção completa da natureza pela humanidade, ou, para falar a linguagem de Fichte, a identidade entre o eu e o não-eu; ou ainda, como dirá hegel, a realização da Ideia absoluta no espírito humano, o nascimento de deus no homem. (pg 135);
" Para Schopenhauer, todo o desenvolvimento filosófico ao qual se vinculam os nomes de Fichte, Schelling e Hegel não passa de uma excrescência parasitária do Kantismo. Ele não esgota as invectivas contra "os três sofistas". Deseja reconhecer "algum talento" em Schelling. mas Fichte não passa " da caricatura de Kant", o espelho amplificador de seus defeitos".
" Quanto a Hegel, esse "Calibã" da filosofia", quem poderia dizer o número de cérebros que que ele transtornou? O strês representam " a descendência bastarda" de Kant, de quem ele é o herdeiro legítimo: esse é o espírito habitual dos prefácios e das digressões de Schopenhauer". (pg 136);
" Para Schopenhauer, Kant é o verdadeiro iniciador dos estudos filosóficos. O efeito que a leitura de seus escritos produz sobre um espírito bem constituído pode ser comparado- diz ele- ao que a operação da catarata produz sobre um cego. Com Kant começa uma nova maneira de filosofar. " (pg 137). D o mesmo modo que a inteligência recebe os dados da sensibilidade e com ele frma juízos, a razão retoma os juízos formados pela inteligência para agrupá-los, religá-los, reduzi-los aum sistema." (pg 143); Assim como a sensibilidade tem suas formas e inteligência tem suas categorias, a razão tem suas ideias diretoras, segundo as quais ela constrói as ciências. São as idéias da alma, universo e Deus, sobre as quais se fundamentam psicologia, cosmologia e teologia racionais; ideias independentes de qualquer experiência,e por conseguinte, vazias de todo conteúdo real." (pg 143);
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